segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

O ESOTERISMO DE DANTE



O voi che avete gl´ intelletti sani,

Mirate la dottrina che s´asconde

Sotto il velame delli versi strani!





Com estas palavras, Dante indica de uma maneira muito explícita que há em sua obra um sentido oculto, mais propriamente doutrinal, do qual o sentido exterior e aparente não é mais que um véu. Em outro trecho, o poeta vai ainda mais além, e declara que todas as escrituras, e não só as escrituras sagradas, podem compreender-se e devem explicar-se principalmente segundo quatro sentidos: «si possono intendere e debbonsi sponere mas-simamente per quattro sensi»2.



Assim , o fato de que a Divina Comédia, em seu conjunto, possa interpretar-se em vários sentidos, é algo desde há muito totalmente fora de dúvida, posto que a esse respeito contamos com o testemunho do próprio autor, certamente melhor qualificado do que qualquer outro para nos ensinar a respeito de suas próprias intenções.



http://www.sophia.bem-vindo.net/tiki-index.php?page=Coomaraswamy+Dante&structure=Ananda+Coomaraswamy+Metafisica




Já faz algum tempo que se reconheceu plenamente que as analogias islâmicas são de singular valor para uma compreensão profunda da Divina Comédia de Dante, não só em conexão com a forma básica da narrativa mas sobretudo no que concerne aos métodos pelos quais são comunicadas as teses. E isto seria igualmente válido, inteiramente aparte da consideração de quaisquer problemas de ‘’influência’’ que pudessem ser considerados desde o ponto de vista mais restrito da história literária. H. A. Wolfson assinalou justamente que as ‘’literaturas filosóficas’’ medievais, árabe, hebraica e latina ‘’eram de fato uma única filosofia expressa em línguas diferentes, traduzíveis quase que literalmente uma a outra’’. Se isto é verdade, isso não é meramente  um resultado da proximidade ou influência, nem, pór outro lado, de um desenvolvimento paralelo, e sim que se deve ao fato de que ‘’A cultura é um todo unificado’’, e nas diversas culturas se encontram os dialetos de uma única linguagem espiritual’’, devido ao que ‘’é evidente entre todos os povos uma grande linha de metafísica universal’’. Sem ir demasiado longe no tempo e no espaço - e poderíamos ir tão longe como á Suméria ou a China antiga - bastará dizer, para os propósitos presentes , que o que Wolfson afirma do árabe, do hebraico e do latim será de igual validez se se agrega á lista o sânscrito. 


Há anos tbm chamamos repetidamente a atenção sobre os notáveis equivalentes doutrinais, inclusive verbais, que podem ser demonstrados na literatura tradicional, medieval latina e indiana védica, a respeito das quais, se si hubieran de asumirse traspasos, la prioridad habría de ser concedida al lado védico; pero no ha de asumirse ningún traspaso.



NOTAS



1. Ver Miguel Asín Palacios?, La Escatología musulmana en la Divina Comedia? (Madrid, 1919), y la traducción abreviada por H. Sunderland, Islam and the Divine Comedy (Londres, 1926).

2. Luigi Valli, Il Languaggio segreto di Dante e dei «Fedeli d'Amore» (Roma, 1928); René Guénon, El Esoterismo de Dante (París, 1925); ídem, «El Lenguaje secreto de Dante y de los Fieles de Amor?»,Se han hecho comparaciones indias y zoroástricas en Angelo de Gubernatis, «Dante e l'India», Giornale della Societá Asiatica Italiana, III (1889), y «Le Type indien de Lucifer chez Dante», Actes du Xe Congrés des Orientalistes»; y J. J. Modi, Dante Papers: Viraf, Adamnan, and Dante, and Other Papers (Londres, 1914). Muchos de los problemas están ligados con los de la historia de los templarios y rosacruces.

3. The Philosophy of Spinoza, Cambridge, Mass. (1934), I, 10.

4. Alfred Jeremías, Handbuch der altorientalischen Geisteskultur (Berlín, 1929), p. X.

5. J. Sauter, Die altchinesische Metaphysik und ihre Verbundenheit mit der abendlandischen, Archiv fur Rechts- und Sozial-philosophie, XXVIII (1934), 90.





(..)



A apoteose final das duas ascensões É A MESMA: os dois viajantes, elevados até a presença de Deus, nos descrevem a Deus como um foco de luz intensa, rodeada de nove círculos concêntricos formados pelas filas cerradas de inumeráveis espíritos angélicos que emitem raios luminosos; uma das filas circulares mais próximas do foco é a dos querubins; cada círculo rodeia o círculo imediatamente inferior , e os nove giram sem trégua ao redor do centro divino... Os pisos infernais, os céus astronômicos, os círculos da rosa mística, , os coros angélicos que rodeiam a Luz Divina, os três círculos que simbolizam a trindade de pessoas, estão tomados por Dante PALAVRA POR PALAVRA  á  Moh-yiddin Ibn Arabi.



Tais coincidências, até em detalhes extremadamente precisos, não podem ser acidentais, e temos muitas razoes para admitir que Dante se inspirou efetivamente,em uma medida bem importante, nos escritos de Mohyiddin; ¿pero cómo es que los ha conocido? Se considera como possível intermediário a Brunetto Latini, que havia passado uma temporada na Espanha; mas esta hipótese nos parece ainda pouco satisfatória. Mohyidin havia nascido na Múrcia, de onde vem seu sobrenome, El-Andalûsi, mas não passou toda sua vida na Espanha, e morreu em Damasco; por outro lado, seus discípulos estavam espalhados por todo o mundo islâmico; mas sobretudo na Síria e no Egito, e finalmente é pouco provável que suas obras hajam sido de domínio público, inclusive algumas delas não vieram a público jamais.



Com efeito, Moh-yiddin foi algo muito diferente e maior que o ‘’Poeta Místico’’ que imagina M. Asín Palacios; o que convém dizer aqui é que, no esoterismo islâmico, selhe chama Esh-Sehikh el-akbar, seja, o maior dos mestres espirituais, o MESTRE por excelência, que sua doutrina é de essência puramente metafísica, e que várias das principais Ordens Iniciáticas do Islã, entre as quais estão as mais elevadas e fechadas ao mesmo tempo, procedem diretamente DELE.



Já indicamos que tais organizações estiveram, no éculo XIII, ou seja, na mesmaépoca de Moy-yid-din, em relações com as Ordens de Cavalaria, e, para nós, é isso que explica a transmissão constatada; se fosse de outro modo, e se Dante houvesse conhecido Moy-yid-din por vias ‘’profanas’’, porque não o citou nunca, da mesma maneira como fez com filósofos exotéricos do Islã, Avicena e Ave-rroes? Além do mais, está reconhecido que houve influências islâmicas nas origens do Rosacrucianismo, e é a isso exatamente que a fazem alusões as viagens de Cristhian Rosenkreutz ao Oriente; mas a origem real do Rosacrucianismo, já dissemos, são precisamente as Ordens de Cavalaria e foram elas que formaram, na Idade Média, o verdadeiro laço intelectual entre Oriente e Ocidente.

  

Os críticos ocidentais modernos, que não consideram a’’VIAGEM NOTURNA’’ de Maomé mais do que uma lenda mais ou menos simbólica, pretendem que essa lenda nãoé especificamente islâmica ou árabe, mas que seria originária da Persa, porque o relato de uma viagem similar se encontram um livro mazdeísta, o Ardâ Vîrâf Nâmeh.



Alguns pensam que é necessa´rio nos reportarmos ainda mais longe, até a Índia, onde se encontra, pelo visto, tanto no Brahmanismo como no Budismo, uma multidão de descrições simbólicas os diversos estados de existência (estados expandidos de consciência) sob a forma de um conjunto organizado de Céus e Infernos; e alguns chegam inclusiva a supor que Dante possa ter sofrido diretamente a influência indiana. Naqueles que nãovêem em tudo isso mais que ‘’literatura’’, se compreende esta maneira de considerar as coisas, ainda que seja bastante difícil, inclusive desde o simples ponto e vista histórico, admitir que Dante possa ter conhecido algo da India de outro modo que não fosse pela mediação dos Árabes. Mas, para nós, essas semelhanças não mostram nada além da UNIDADE da doutrina que está contida em todas as tradições;  não há nada de surpreendente em que encontremos por todas as partes a expressão das mesmas verdades, mas precisamente, para não passarmos a vida todo nos surpreendendo com essas semelhanças, primeiro é necessa´rio saber que ‘’SÃO VERDADES’’, e não ficções mais ou menos arbitrárias. Ali onde não há mais que semelhanças de ordem geral, não há espaço para concluir uma comunicação direta; esta conclusão não está justificada mis do que se as mesmas ideias fossem expressas sob uma forma idêntica, o que é o caso de Moh-yid-din (Ibn Arabi) e Dante. É mais que certo que o que encontramos em Dante está perfeitamente de acordo com as teorias hindus dos mundos (lokas) e ciclos cósmicos, mas SEM estar revestido da forma própriamente hindu; e este acordo existe necessariamente em todos aqueles que têm consciência das mesmas verdades, quaisquer que tenham sido as maneiras pelas quais eles tenham adquirido seu conhecimento.



René Guenon

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